Nós recomendamos a leitura desse excelente livro de Marcos Bagno: "Preconceito Linguístico: o que é, como se faz"
Primeiras Palavras
Existe uma regra de ouro da Lingüística que diz: “só existe língua se houver seres humanos que a falem”. E o velho e bom Aristóteles nos ensina que o ser humano “é um animal político”. Usando essas duas afirmações como os termos de um silogismo
(mais um presente que ganhamos de Aristóteles), chegamos à conclusão de que “tratar da lígua é tratar de um tema político”, já que também é tratar de seres humanos. Por isso, o leitor e a leitora não deverão se espantar com o tom marcadamente politizado de
muitas de minhas afirmações. É proposital; aliás, é inevitável. Temos de fazer um grande esforço para não incorrer no erro milenar dos gramáticos tradicionalistas de estudar a língua como uma coisa
morta, sem levar em consideração as pessoas vivas que a falam. O preconceito linguístico está ligado, em boa medida, a confusão que foi criada, no curso da história, entre lígua e gramática normativa. Nossa tarefa mais urgente é desfazer essa confusão. Uma receita de bolo não é um bolo, o molde de um vestido não é um vestido, um mapa-múndi não é o mundo... Também a gramática não é a língua. A língua é um enorme iceberg flutuando no mar do tempo, e a gramática normativa é a tentativa de descrever apenas uma parcela mais visível dele, a chamada norma culta. Essa descrição, é claro, tem seu valor e seus méritos, mas é parcial (no sentido literal e figurado do termo) e não pode ser autoritariamente aplicada a todo o resto da língua — afinal, a ponta do iceberg que emerge representa apenas um quinto do seu volume total. Mas é essa aplicação autoritária, intolerante e repressiva que impera na ideologia geradora do preconceito linguístico. - Trecho da apresentação do livro.
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